Viagem ao Leste Europeu

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Quando se viaja sozinha, sentimentos de expectativa, a ansiedade natural, a inquietação e a experiência de desbravar o não-visto, dão lugar a sensação de completude quando tudo se conecta, se articula ao encontrar com um grupo de pessoas das mais diversas nacionalidades e culturas, as quais, durante 20 dias, irão trilhar o mesmo trajeto.

Quando era criança, me encantava com as gravuras no colégio de irmãs, momento em que precisava reproduzir, pincelando na tela tamancos holandeses (que agora sei, são de madeira), moinhos de vento, tulipas, os canais, paisagens. E agora estava lá, na linda cidade de Amsterdã, depois de ter deixado Bruxelas, surpreendentemente bela.

O tour continuou: Berlim  (um toque emocionado nos restos do muro que dividia a cidade até 1989; um olhar no portão de Brandemburgo de significativo valor histórico) e finalmente rumo à Praga. Foi então que me senti novamente estrangeira mas de um modo estranho e inusitado. Na fronteira com a República Checa e por orientação do guia, passaportes em mãos. Chegamos à alfândega. Guardas entram no autobus, pegam todos os passaportes (armados como para batalha). Uma hora de espera; a viagem tinha sido longa, amenizada pela autoestrada espetacular. Finalmente os passaportes de volta para alívio de todos, entregues de mão em mão. Me pareceu que estavam querendo “ mostrar serviço” , aqueles guardas da alfândega checa mas ao mesmo tempo entendi que o comunismo recente deixara suas marcas significativas.

Enfim: Praga. A começar pelo idioma, o qual não se entendia absolutamente nada. Respondiam ao inglês com a mesma má vontade dos franceses. A maioria respondia em checo e ainda esperavam agradecimento. Os que falavam inglês, com certeza estavam ganhando dinheiro: onde estivesse, me via rodeada por canequinhas, camisetas, parecendo que todas aquelas lojas, lindos cubículos medievais agora para turistas, vendiam a mesma reprodução. E me dei conta de que estava na capital da Boehmia, dos cristais incomparáveis do coração da Europa, onde a história levou séculos para construir pontes, castelos, monumentos e ruas estreitas. Não deu para visitar a casa do torturado Kafka mas conheci o famoso relógio no prédio da Prefeitura. Uma aglomeração de pessoas mirando suas máquinas fotográficas para cima, esperam a hora certa onde logo o famoso relógio irá funcionar. Onze horas: abrem-se duas portinhas na torre, rodam figuras surreais, como apóstolos, esqueletos. O relógio é bonito, do séc. XV, incrustado no prédio gótico.

Depois Budapeste, das quais os húngaros se orgulham (com razão). Cortada pelo rio Danúbio, de um lado Buda (cidade velha) e de outro Pest (a parte nova). Tudo é majestoso em termos de arquitetura de mais de 1.000 anos. Parece que pouco está restaurado; é uma cidade envelhecida mas o povo mantém um ritmocontemporâneo deixando transparecer o consumismo incipiente. A noite um passeio de barco, despedida do grupo pelo Danúbio. Foi quando deu para entender porque os húngaros comparam orgulhosamente Budapeste com Paris Iluminado.

Por fim a Viena linda e elegante; depois uma conexão em Paris para voltar ao Brasil e a sensação de que “nunca se volta igual de uma viagem”; a certeza de que a globalização facilita e torna muitas vezes possível a realização de um sonho, da qual não devemos nos privar por mais inacessível que possa parecer. O ser humano precisa de experiências para enriquecer seu mundo interno e assim comprometer-se mais com o próximo, com o seu entorno.





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Texto publicado no Jornal NH do dia 06/11/2007.

1 comentários:

renata lehmann disse...

a leitura dos teus textos provoca prazer e cultura. Também acho que a gente nunca volta igual depois de viajar! bj