SER criança- do avental sujo de ovo à tecnologia.

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"A boneca de louça, de tão linda, se quebrou".... lembranças, sensíveis  recordações.

Onde contruí meu mundo, meu self.

Lembro perfeitamente como era a minha boneca inesquecível. Posso quase sentir sua textura, visualiza-la. Seu rosto era de louça, duas trancinhas caiam sobre seus ombros , seu vestidinho era listado azul e branco. Minha companheira inseparável com a qual tinha longos monólogos e lembro que eu acreditava que ela me ouvia. Só não lembro do nome. Acho que o enterrei no momento em que ela se quebrou.. caiu. Agora não tenho ninguém para ajudar lembrar: o ciclo vital se encarregou de levar aquela que eu amava com toda a minha alma e seria a única que lembraria.
Minha companheira inseparável com a qual
tinha grandes monólogos.
 E brincava muito: de casinha, vermelha de dois andares, onde as bonequinhas eram os personagens de uma peça teatral, com protagonista, coadjuvantes e figurantes. Representavam a minha vida. Uma infância feliz de contatos com meus irmãos, primos e amigos da "aurora da minha vida", onde fui construindo meu self  através de brincadeiras, travessuras, descobertas e encantamentos, cantigas de roda e de ter tempo para contar estrelas que povoavam meu imaginário.E de perceber  que existia bem perto, um " avental todo sujo de ovo".



Este self, o eu, cria-se através do vínculo mãe-bebê. O amor de mãe é o nosso primeiro amor. Nos dá proteção. É o nosso socorro, o nosso abrigo. É a nossa segurança. A mãe ama sem limites, sem condições nem interesses próprios, sem exigir nada em troca. Vive para o filho. Sem dúvida, se preciso,  morrerá por ele.A amamos tanto, dependemos dela, mas de repente crescemos e nos damos conta que ela é de carne e osso. Não é mais o ideal perfeito ; se ressente, se queixa, se cansa como os outros. E é necessário que seja assim, caso contrário a simbiose, a ligação primeira mãe-bebê, continuará pela vida afora, dificultando a autonomia e a independização.

E, se esta mãe for "suficientemente boa", como afirma o genial psicanalista inglês Winnicott, a criança será feliz e mais tarde um adulto inteiro. Ele enfatiza também, a importância do brinquedo e da criatividade para a saúde mental da criança.Para ele, muitos problemas da fase adulta, surgem em decorrência de conflitos entre a criança e a mãe. Mas se ela for presente e continente ( Bion), aquela que nos estágios diferentes de  desenvolvimento de seu filho través de  holding, ou seja, um "colo" propício ao desenvolvimento saudável  e formação de um Ser - humano independente e feliz, os sonhos e fantasias se confirmarão.

O amor da mãe é o nosso primeiro amor
 Aos poucos percebemos que começamos a nos afastar desta mãe, e aprendemos a amar uma " mãe que -não- é- eu". Uma das nossas primeiras perdas.
E chega o dia em que a vida, o DEVIR, ou seja, a nossa capacidade de vir a ser únicos, a caminhar com nossos próprios passos, nos põe à prova: não podemos chegar ao amor adulto sem passar pelo infantil, não podemos amar se não sabemos o que é o amor, não podemos amar outra pessoa se não tivermos amor suficiente por nós mesmos. Um amor que aprendemos, sendo amados na infância. Em nosso tempo de criança!

Criança: monstros, bruxas, fantasias povoam seu imaginário na tenra idade. Ela brinca e o brinquedo é uma criação contínua, livre e espontânea. É através do brinquedo que a criança conquista sua relação com o mundo exterior e entra em contato com os objetos.Menino e menina: eles preferem configurações arquitetônicas onde possam " plantar seus amigos" e interagir com seus super heróis; elas preferem decorar o ambiente em que se encontram.

Todo o brinquedo tem seu significado. Grandes teóricos como Erickson e Melannie Klein, confirmam o seu conteúdo latente, aquilo que não é dito; só é conhecido através da psicanálise, que nos revela o inconsciente da criança. Por isso, o brincar no ambiente terapêutico: para entender seus conflitos que muitas vezes estão na família; a criança serve,  como porta voz dos mesmos, depositados nela.


É através do brinquedo, que a criança conquista sua relaçãcom o mundo exterior
A criança constrói com seus jogos um mundo representativo no qual dedica todo o seu cuidado. E a organização do brinquedo pode ser considerada como uma organização psíquica. Isto é interpretado, e então permite o alívio da ansiedade, pois eles contém fantasias projetadas pelo inconsciente da criança.

Mas....não existe mais "o avental todo sujo de ovo" de minha infância querida... Outros tempos.. outros interesses... outros estímulos.

O que aconteceu? Que era é essa?E agora?

A essência dos amores primeiros, continua a mesma. Mas o mundo mudou, e muito. As crianças na idade escolar, agora vivem em contato direto com a  pós-modernidade, noutro tempo, sabemos disso. O da tecnologia. Como será o futuro destas crianças? Não sei, não sabemos, ninguém sabe e muitas vezes me parece que elas estão funcionando como "cobaias de laboratório". Ninguém sabe o devir, o por-vir destas crianças.

Existe  o amor parental. O mesmo colo, o mesmo olhar, mas as famílias se constituem de forma diferente, fazendo com que que haja reestruturações e  obviamente  os conflitos aumentam.

As crianças  por sua vez, continuam brincando, fazendo travessuras, aprendendo mas precisam procurar de modo incansável sua inserção na cultura global. Pequenos grandes e competitivos consumidores  de artigos em voga na mídia, vivendo nesta condição pós - moderna.
Mais do que as marcas o importante para elas são os ícones infantis mercantilizados: Barbies, celulares,  um sem  fim de objetos provisórios, efêmeros e instantâneos reproduzindo comportamentos também instantâneos, efêmeros e cambiantes.

E como isto é sentido  pelas  crianças?

Crianças sabem tudo sobre Iphones, Tablets..

Elas vivem o mundo precoce da visibilidade como o fazem as pessoas de seu conviver. O ter!  São as crianças hightech, que sabem tudo sobre o uso e funcionamento dos note books, celulares, Iphones, Tablets, tanto como os adultos. Aprendem uma linguagem  de culto à tecnologia.

Estudos feitos, demonstram que isto pode levar  a criança a não mostrar interesse por uma determinada prática por muito tempo.As crianças pós modernas, desejam fazer parte do mundo das visibilidades, aparecer para poder ser.
Preocupante constatação:o que o homem criou com seus avanços o está comprometendo muito. Mesmo os mais otimistas, tem  sensibilidade para perceber isto.

A infância como a fase da  dependência, da insegurança e da ignorância saudável dos segredos do mundo, parece que está desaparecendo, dando lugar à crianças insondáveis, enigmáticas, com dificuldades nas relações, inseridas no mundo da cibernética. O número de diagnósticos de hiperatividade cresce , mas cuidado! Na maioria das vezes o TDAH ( déficit de atenção com hiperatividade), é uma denúncia que a criança está fazendo pelo desamor na família, por crises que estão acontecendo entre os pais e no seio da família.Ela também pode sofrer com a ansiedade de separação, no momento de ir à escola, aparecendo aí manifestações maníacas, de acordo com a leitura psicanalítica, ou seja, a hiperatividade. Cabe ao terapeuta resgatar, junto com a criança, o equilibrio psíquico.

  Existe ainda, no século XXI,  o convívio com a natureza e com o outro: o andar de bicicleta, a prática de algum esporte, a conversa "jogada fora", o resgate daquele filho que passa horas e horas conectado ao computador ou celular, no videogame, nos jogos eletrônicos. Um menino de 10 anos até se arrisca a cantar cantigas de roda,  mas prefere horas no computador com o Power Ranger substituindo  A pantera cor de rosa, por ex., que povoaram de encantamento crianças do século que passou. Existem silêncios que "falam" de solidão.. e que leva a individualização. Muitos pais estão atentos! Sabem da necessidade do dialogar familiar.


Muitos pais estão atentos. Sabem da necessidade
do dialogar familiar.
Eles estão precebendo a altivez infantil e as emoções que isto desperta neles e precisam entender que vivemos numa quebra de paradigmas. Cabe aqui entender o contexto desta nova infância e a necessidade de adaptação dos pais. Entender que vivemos uma revolução de costumes, que mexe com nossas convicções e nos faz rever valores e formas de relacionamento. A certeza de que o mundo muda, a criança muda, nós todos mudamos mas existem necessidades que não mudam. Todos continuamos necessitando do amor. Amar estas crianças tão inteligentes, que clamam por um olhar e um colo no qual se abandonam completamente num afago.Felizmente o amor, as boas leituras , um tempo para a família que os pais possam dedicar a seus filhos, funcionam como "colo" para a criança que daqui há pouco irá adolescer, pois terminará logo a infância. Começará então, na adolescência, uma etapa nova no Ciclo Vital, linda como a infância mas complicada, de delicado luto pela perda da criança que existia. Os hormônios provocando mudanças visíveis , enfim ... Sentirão a saudade da infância, tão maravilhosamente retratada por Casimiro de Abreu em sua antiga e sempre linda poesia: "Ai que saudades que eu tenho.. da aurora da minha vida.. da minha infância querida.. que os anos não trazem mais", apesar de nunca te-la ouvido.

Gerações que se sucedem: X, Y e Z.

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Frequentemente , não só  os Psicólogos enquanto estudiosos da alma e do comportamento humano mas também os que se interessam de alguma forma pelas emoções: Relações Humanas, Corporativismo, ou os das Ciências Exatas na área da Nanotecnologia, enfim, os seres humanos, tem acompanhado um fantástico desenvolvimento tecnológico.Um boom na humanidade. Isto provoca mudanças muitas vezes estruturais em nosso fazer profissional, por isso precisamos sempre de novas atualizações.
A Internet era algo inimaginável

 Fantástico este milênio no qual temos a oportunidade e o privilégio de viver!

Vários escritores ficcionistas, já previam muitas modificações em nosso "modus vivendi" e "operandi". Alguns anteciparam-se mas  muito do que previam, ainda não aconteceu: Arhur Clark, escritor britânico,  publicou na segunda metade do século passado, o livro "2010: o ano que faremos contato", onde imaginava que o computador , na primeira década deste milênio, estaria pensando e tomando decisões, dominando assim as máquinas através de um  alto grau de sofisticação. E o homem , um expectador e executor . Ainda não vemos este domínio mas sim as conquistas na área da neurociência, da biologia molecular e da física: a nanotecnologia não era nem pensada pelos melhores escritores; hoje podemos estar muito além do que escritores como Clark, na década de 60 imaginava. A internet era algo inimaginável e se tornou  incrivelmente popular e acessível em todas as partes do planeta.Podemos acessar informações numa velocidade incrível em alguns segundos. Nunca houve tantas descobertas na tecnologia como nos dias de hoje.Não temos um mundo noutro planeta mas temos decobertas incríveis. Através da explosão simulada, por exemplo, vimos como surgiu a  vida nos  momentos iniciais, após a explosão do evento científico Big Bang, que deu origem ao nosso universo, de acordo com a teoria cética e científica.

Por sua vez, vão surgindo neologismos, novas terminologias no transcorrer do tempo, como necessárias para classificar e assim podermos entender demandas advindas das mudanças. Ocorridas, principalmente de 50 anos para cá, precisam ser explicadas, entendidas e introjetadas.Nasce pois, uma nova forma , corporativa ou instituída, como recurso para distinguir e caracterizar as gerações. Muitos estudiosos chamam de " Teoria das gerações":

Geração X, que desemboca com seus descendentes na agora era tecnológica: seus filhos que fazem parte da  geração Y, que  por sua vez, constitue a atual geração sofisticada tecnologicamente, a geração  Z! Fazem avolumar um acervo digital através de uma pequena fortuna em bens digitais: tablets, smartphones, e-books, etc. Que geração virá depois? Deixaremos esta herança fantástica  às próximas gerações? Me parece infinito.. um  caminho sem volta, que o próprio homem criou e agora tem que dar conta!

Não nomear indivíduos com as mesmas características de épocas diferentes
As gerações assim nomeadas, X,Y,Z , possibilitam não perceber os indivíduos com as mesmas características  de épocas diferentes. Fica assim, fácil entender que um adolescente do século XXI terá características diferentes de um do século XX, ou nascido nos anos 50, 70 ou 90.

Quais as características da geração X? São os nascidos  dos Baby Boomers da Segunda Guerra Mundial.
Quem eram os  Baby Boomers? Criados num cenário " pós guerra", eram otimistas, passaram pela reconstrução da Pátria destruída pela guerra,  visão de progresso, esperança por um mundo melhor, consciência política, sensibilidade, ambição, sucesso. Assim chamados, da expressão do inglês: " explosão de bebês". Estes, nasceram teoricamente entre 1943-1960.

Estes conceitos , muito usados  principalmente nos estudos sobre tecnologia, e no corporativismo,permitem  separar pessoas em grupos. E como toda a classificação nova, considero que  está sujeita a critérios de julgamento e problemas. E faz pensar: como uma pessoa da geração X, por exemplo, podem acompanhar as mudanças tecnológicas e dominar as ferramentas de trabalho renovadas a cada dia, como o fazem as gerações posteriores? Com certeza assustam-se, atrapalham-se diante da máquina. Sua alfabetização foi a cartilha, o quadro negro, o giz, a disciplina que um "olho no olho" já propunha e bastava.

Solidão, dependência, da tecnologia.
 E muitas vezes impotentes, por ignorarem, notam sabiamente os problemas que os jovens, muitas vezes seus filhos, possam apresentar: solidão, dependência da tecnologia, quase rompimentos dos vínculos reais e outras manifestações psicológicas: depressão, isolamento. Vejo a geração X como criadora da globalização e da crise.Uma incrível e paradoxal transição!!

X,Y,Z! Características:

 A geração X,  que estudiosos  classificam como os que nasceram entre 1960-1980.
Cenário onde foram criados: seus pais,  workaholics desligados muitas vezes de empresas devidos aos avanços tecnológicos; mulheres que foram à busca de empregos para agregar renda à família. Novas carreiras surgiram para homens e mulheres e suas cacterísticas em evidência despontam junto às primeiras tecnologias; criativos, anseio por atividades prazerosas, busca do sentido da existência, início da liderança feminina, comunicação efetiva.

E a geração Y?
Ansiosos, empreendedores,atentos à qualidade de vida e ao status
 Também chamada  como Geração NEXT: pessoas nascidas entre os anos 1980 e 2005 e por isso, filhos da geração X e netos da geração Baby Boomers. São os que sonham em conciliar trabalho e lazer, e muito ligados às novas mídias. Ficavam com seus avós Boomers enquanto seus pais saíam para o trabalho. Trata-se da geração do tudo pronto: hora de ir para a escola, de ir  à natação, hora de jantar,  de brincar,  de fazer judô, etc. Geração formalmente assediada pelos avanços tecnológicos. Com isto não é difícil perceber suas características de perder a capacidade de planejar, mas de aprender com facilidade, resilientes ( resistentes à frustrações), fazem várias coisas ao mesmo tempo, vivem o hoje de forma intensa, práticos, objetivos, inovadores: feedback torna-se quase indispensável. Ansiosos, empreendedores, atentos à qualidade de vida e status.

A Geração Z, a atual.Conectada através de dispositivos da cibernética, nascidos a partir de 2005.Muitos autores afirmam que podem ser integrantes ou parte da geração Y, e concordo: precoces cognitivamente, visto sua estimulação, vêem muitas vezes seus lares ruirem. Os relacionamentos de seus pais duram cada vez menos tempo e muitos são criados pelos avós (X) ou creches, babás, escolas, etc. Computador e tecnologia fazem parte de sua educação básica. Com cerca de 4 ou 5 anos, já se sentem bem à vontade com as novas tecnologias, diferentes da Y que sofreu com o momento de mudança. Importante momento!

Estas classificações surgiram recentemente no âmbito organizacional e possibilitaram criar-se a " Teoria das gerações". Vejo como uma nova tendência a espera de comprovamento científico.Mas bem fundamentada. A transgeracionalidade, o que e como se passa de geração em geração, é um contexto  estudado com profundidade  na Psicanálise e por ela entendido  em seu olhar científico
No Marketing, surgiram para entender como se comporta o consumidor e rapidamente virou estudo de psicólogos e profissionais das Relações Humanas, para entender como agem os colaboradores.
Em nosso cotidiano, as pessoas da geração Y podem  perceber que tem características da geração X. Isto explica a importância da transgeracionalidade, de que nosso comportamento, nossa personalidade é fruto da interação com o meio no qual fomos gerados, ou seja, de nossa herança genética e  meio cultural.
Necessitamos do afeto e do olhar do outro para sermos felizes

O futuro destas gerações, não sei... o que virá, incógnita total, talvez uma geração alfa? Mas sem jamais perder a ternura, o convívio, os vínculos afetivos. Somos seres gregários, necessitamos do afeto e do olhar do outro para sermos felizes.
Enfim, não foram as gerações que mudaram, não fomos nós quem mudamos, FOI O MUNDO QUE MUDOU.

Paris: Mercado de Pulgas e Maria Antonieta.

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Paris, janeiro de 2012. Chegada à movimentada  estação do metrô Porte de Clicgnancourt, linha 4. A calefação, funcionando com toda a sua  potência, me protegia do calor e, de repente, subindo dois lances de escada, eis-me na superfície: frio de 5 graus , o sol iluminando o lado norte da Cidade Luz, no 18 arrondissement. O encontro feliz e caloroso com amigos que me levaram a conhecer um dos lugares mais interessantes e pitorescos. Ter amigos é importante demais, até em situações assim: amigos brasileiros que moram na França proporcionam estas experiências, numa troca recíproca de saudades.


   ...amigos brasileiros que moram na França, proporcionam
estas experiências, numa troca recíproca de saudades.



Estava me dirigindo a um lugar que vale a pena visitar. E, então,  não raro ouvia  turistas  perguntando e um parisiense não tão inacessível assim, orientando:  "Le marche? Aux puces de Saint-Ouen", indicando e sinalizando um endereço de visita importante, guardando as proporções e em outro segmento, como o Louvre e o Arco do Triunfo. Percebi que é um conterrâneo destes lugares, tão rico em histórias quanto os próprios.

Depois de andar tanto, esqueci o frio. Não me incomodava mais e finalmente: "Aux puces de Saint - Ouen"! Somente alguns minutos lá, para perceber que aquele lugar era o paraiso para turistas de derradeiros tostões no bolso, a fechar seu sonho de conhecer Paris. E então para mim também, pois depois de um mes, a viagem estava terminando. No dia seguinte voltaria ao Brasil e me pareceu que esta visita ao Mercado, era perfeito para um final de viagem; e na volta, já no avião,  quando a aeromoça sorridente passaria oferecendo produtos de perfumaria, com o carrinho da boutique da empresa  aérea, num impulso  pegaria alguns euros que sobraram e que as vezes possibilita comprar  souvenirs para meus amores que ficaram aqui me esperando. E sentiria  que o que gastei no Puces de Saint-Ouen, foi uma troca válida. Os presentes estariam na mala, no bagageiro do avião e no meu coração, estariam todas as boas lembranças da viagem, junto ao que havia trazido do Mercado de Pulgas de Saint-Ouen.

E o que seria Les puces de Paris  Saint-Ouen?

Puces de Saint-Ouen ( Mercado de Pulgas)

Este Mercado é mais uma feira de antiguidades, um local  vintage, onde pode-se olhar de tudo, garimpar à vontade, desde que se tenha fôlego. Afinal, são 11 km de ruelas, passarelas e explorar cada cantinho, era um convite irresistível, mas impossível. Precisaria de uns tres dias, então conformei-me ao que era sensato. Seguir junto aos amigos, que junto ao seu carinho, me ciceroneavam e onde paravam, gentilmente eu seguia seu roteiro. Afinal, eu estava deslumbrada e tudo para mim era um espetáculo!!! E como diz Fernando Pessoa, " Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena".

Soube que, antes de se popularizar em outras capitais da Europa, este tipo de comércio era característico dos subúrbios da França, mais precisamante de Saint-Oues. Depois, vários mercados começaram a abrir nesta região do norte de Paris, depois da primeira Guerra Mundial e o lugar virou moda!

Não se trata de simples objetos velhos(...) uma festa para os visitantes
 Roupas, mobiliários, luminárias, quadros, bibelôs, biscuits, bijouterias, jóias, livros, roupas eram vendidos. Hoje, forma um grande labirinto que recebe cerca de 9 milhões de visitas ao ano. Percebi que não se trata de simples objetos velhos. Podemos encontrar, ao lado de uma loja de discos ou livros, produtos da Gucci, Chanel, Hermès e outros em ótimo estado, por mais da metade do preço; uma festa para colecionadores, profissionais da moda e para o próprio visitante. Curioso é perceber que a sustentabilidade se faz presente; tão em voga quanto as novas tecnologias que visam agredir menos o ambiente, está a idéia de reduzir o lixo e evitar o acúmulo do consumismo: comprar uma roupa que pode ser usada denovo. Virou alternativa fashion e inteligente nas grandes cidades. E uma filosofia. (Ainda chegaremos lá)....

Maria Antonieta: a última Rainha da França
E, caminhando nestes corredores, depois de entrar, admirar obras de arte, folhear revistas e livros, admirar móveis e objetos do início de 1900, art deco dos anos vinte e  trinta , talheres, objetos da arte africanas e orientais, câmeras e também coisas estranhas, kitch, roupas antigas, eis que meu olhar estanca : numa prateleira entre outras peças antigas, vejo uma linda boneca de vestido azul e penteado de rainha dos castelos medievais franceses. Meu amigo falou: " É Maria Antonieta, leva!" Titubiei, controlei meu impulso, olhei novamente, segui meu caminho. Sentamos cansados para uma pausa e um café reconfortante. Pensei na distância que me separava daquela boneca e que, se não voltasse, nunca mais a veria. Então pedi aos meus amigos que me esperassem,pois iria buscar a Maria Antonieta, a Rainha da França. Por 10 euros estava em minha mão, uma representação da identidade histórica de Versailles, de Luis XVI, dos pobres de Paris. Quem havia feito aquele deslumbrante pequeno vestido, armado e gracioso a vestir a boneca? Nunca saberei, mas tenho a feliz certeza de que a tenho em meio aos meus guardados. E na memória, com exatidão, o momento em que veio parar em minhas mãos.
Estava encantada como uma menina mas mais ainda em ter comigo um pouco da história. Uma preciosidade.

..tenho a  feliz certeza de que a tenho em meus guardados.

Quem foi Maria Antonieta? A última Rainha da França do século XVIII.
Filha de imperadores autríacos que aos 14 anos casou ( sim.. se casava cedo naquela época) com o delfim francês, Luis, que em 1774 tornou-se o Rei da França. Exerceu grande influência política sobre seu marido e consequentemente, sobre toda a França.
Ao iniciar a Revolução Francesa, colocou o rei contra ela. Estudiosos dizem que ela procurava romper um conflito bélico entra a França e Áustria, esperando a derrota francesa. E, em 1792, foi detida e encarcerada pela revolução, junto com seu marido. Depois da execução de Luís XVI foi condenada à morte, morrendo na guilhotina em outubro de 1793.
Em linhas muito gerais, esta foi Maria Antonieta e o é ainda, para a história.

Era uma lançadora de moda inquieta, ( não por acaso encontrei a sua réplica no mercado charmoso de Paris). Chocou ao vestir calças, até então exclusivas dos homens.Deixou de lado os espartilhos e as barbatanas e adotou peças leves, para se aproximar dos camponeses. Quando queria exibir sua riqueza, surgia em público com vestidos suntuosos e penteados rocambulescos, de quase 1 metro de altura. Para a historiadora francesa, Caroline Weber, tudo isto fez dela uma precursora das celebridades atuais, em especial a cantora Madonna. Autora do livro "Rainha da Moda" ( Zahar), já lançado no Brasil, Caroline defende que a nobre foi a pioneira em um comportamento que hoje é comum entre as celebridades.

Maria Antonieta: a primeira figura real européia, a descobrir que não era necessário seguir as tradições para ganhar o respeito do povo. Percebeu que o modo de vestir, poderia ser o componente essencial  de sua fama. Além disso, fez com que o mundo fashion, ficasse acessível para pessoas de todas as classes. Naquela época e guardando as proporções, incrivelmente inusitado!

E assim terminha o meu passeio pelos tesouros do Mercado de Pulgas  de Saint-Ouen e de sempre lembrar: "Le Marche? Aux puces de Saint-Ouen"!!!