Facebook: o antigo álbum .

|



Toquei minha alma ao procurar por antigas fotos guardadas para postar no Face. Foi quando me reencontrei com  os meus guardados. Estes encontros raramente acontecem, os evito pois sei antecipadamente o quanto irão mexer com meus sentimentos. Não me sinto muito a vontade  ao rever  meu passado retrógrado, aquele da aurora de minha vida.Uma emoção estranha, choro sentido mas tranquilo, ao reencontrar pessoas amadas que já partiram e como dizem para consolar, " daqui para a melhor". Que ilusão: "o melhor do mundo é aqui."! Como tentamos nos consolar; sofrendo ou não, aqui é o nosso lugar. Engraçado o ser humano, cheio de defesas mas  necessárias, para evitar sofrimento.
Foi quando me reencontrei com meu guardados.

Vejo fotos, as contemplo e analiso.. são todas lindas, sorrisos abertos, festas, abraços, beijos. Continuei pensando... Fui retirando, uma a uma  de uma grande caixa de lata azul,  fotos. Muitas . Amareladas, intactas, há muitos anos guardadas. Vários momentos que vieram com a mesma velocidade de um flash! Flash, assim mesmo: luminoso instantâneo, vivência, operação de uma máquina fotográfica; não um "flashback", que se aplica para entender a interpretação de um sonho, como metáfora, por exemplo. Lágrimas ao ver as fotos amareladas, tempo inexorável, irresgatável, inacessível mas evocado pela lembrança, pois felizmente, registrado por alguém! Provavalmente alguém de meu viver, como diria Mario Quintana.

Foi então que a vizualizei: uma foto segura por cantoneiras. Cantoneira? Claro, todo o álbum tinha suas cantoneiras. Num footing na Rua da Praia , moda naquele tempo, longo tempo,com meu pai e uma amiga, o meu primeiro amor: minha mãe. E em seu ventre, em algum daqueles inevitáveis e íntimistas momentos de diálogo entre mãe e filha,  soube que ali existia alguém: eu!
Num footing na Rua da Praia,moda naquele tempo.

Pois comecei a pensar: postar fotos no Face... Estamos esquecendo dos álbuns? Agora confinados em uma caixa ou esquecidos num canto da casa, distantes dos olhos e do coração, já estão obsoletos. Acontecendo o mesmo com os livros em relação ao abajour que quase perdeu seu lugar para a internet? Felizmente foi só um susto.Os livros estão mais vivos do que nunca!! Mas quanto ao Face, acho que acertei: é nele que postamos nossos sorrisos, nossas mensagens, nossas fotos em família e com amigos e abaixo uma mensagem como a que consta em meus álbuns , ou atrás das fotos mesmos: " À fada madrinha, uma lembrança de minha primeira comunhão". Claro que escrita com a linda letra quase gótica de minha mãe.

Os álbuns agora, pertencem ao Face. Seja de casamento: para o álbum físico, umas 20 fotos melhores. Para o Face, todas!!! O mesmo acontece nos aniversários de criança: 500 flashes para escolher 50 para folhear. Para o Face, todas!! Numa viagem, todos os cliques baixados no Face. Cópias físicas, 10 para ampliar e enquadrar enfeitando nossas casas ou porta retratos. E depois! Horas a visualizar, momentos de puro deleite a recordar e finalmente o melhor: compartilhar.  Existiria uma viagem feliz sem saber que na volta teria alguém a nos esperar no aeroporto? A ouvir nossas histórias? Ver como voltamos diferentes pois nosso olhar se enriqueceu para comungar nossos conhecimentos e experiências?
E os álbuns nostálgicos com fotos importantes, características imponentes e históricas das cidades? Scanner nas fotos: vão para o Face, grupos se organizam neste foco. Ou enviamos para o jornal da cidade: afinal tem a sessão de Túnel do Tempo e Almanaque.
Nada tem sentido sem o olhar do outro, conforme a Psicanálise.

Para muitos, o Face é sua alma na WEB.

Constato que, para muitos,o Face é a sua alma na WEB, colorida ou preto e branco. Tornou-se  álbum de fotos.Vista por nós mesmos, atrelada em cada um de nós,as fotos são como espelhos onde nos miramos na imensidão infinita da grande rede. Viajamos ao passado, mas também trocamos experiências, textos, saudades, beijos e abraços, confraternizamos, nos decepcionamos,reencontramos e fazemos novos e encantadores amigos.Quem não convive me parece fora do contexto, do que o sistema impõe, mas esta é outra questão muito importante que não cabe aqui.Este texto perderia completamente seu foco, ficaria triste e pesado.Não gosto de nada imposto. Ninguém gosta...  Falando nisso: o Facebook foi imposto por Marc Zuckerberger?  Não. Ele conquistou . Existe este lado  e outro também,o da obsessão. Este perigoso: não devemos nos deixar fixados no mundo virtual pois no real estão as pessoas que amamos, o mundo que nos espera e no qual temos que continuar a nossa essência de vivermos agrupados, no toque e no olhar .
E em algum dia, seremos lembrados em alguma foto. Num álbum de fotografias?

Nossos netos , em algum lugar no futuro, irão mostrar para seus filhos: olha a vovó, o vovô. Como se dará  isto? O Face dará lugar a outra Rede Social , assim como o Google. Um sem fim de ferramentas, aplicativos  e novas tecnologias. Nunca saberemos.

Pois, lembro agora da obra de Adouls Huxley, escrito em 1931, relatando uma verdadeira fábula futurista organizada sob um sistema  com avanços inimagináveis. Foi um "profeta"? Assustadora obra de ficção! Mas me pergunto:a condição humana de muitas conquistas cientificamente possíveis nos levará  aonde? Até que ponto o homem é senhor de si mesmo? Até onde vai o seu poder de criar ?Isto me preocupa!