As Máscaras de Veneza

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Veneza - janeiro de 2005. Fazendo parte de um grupo de turistas latino-americanos ( venezuelanos, mexicanos, portoriquenhos e outros; coincidência  ou não, a maioria profissionais da área da saúde, como médicos, psicólogos ), realizei um sonho acalentado desde o momento em que assisti ao filme italiano  que marcou a minha geração, "O Anônimo Veneziano", na década de 70 quando, ficcionalmente,  fui apresentada à uma romântica cidade: Veneza,  que começou a povoar meus sonhos, meu imaginário mas percebido como inacessível demais para concretizá-lo; algo lindo demais e também  muito distante e inatingível. Para mim, somente existia em algum lugar da Itália. Agora, nesta década de início de um novo milênio, se concretizava. E lá estava eu, na romântica e linda cidade européia, uma ilha de uma lagoa, separada do Mar Adriático por um istmo. Encantadora  e fascinante Veneza dos meus sonhos.

A Veneza dos meus sonhos- Piazza di San Marco


  Sonhava com os canais, a Ponte dos Suspiros, as pombas da  Piazza di San Marco e.. as máscaras!!! De repente, me encontrava  partindo do continente italiano, de Vaporetto, um barco ( um ônibus fuvial) que  me levou a conhecer a alma de Veneza. Lá esquecemos de carro , ônibus - eles não circulam em Veneza. Se percorre tudo a pé. Primeiro olhar: a bela Piazza di San Marco. Uma parada para um cappuccino no restaurante Florian, inesquecível sabor e o verdadeiro sorvete ( gelatto). Ruelas encantadoras, seculares, repletas de histórias misteriosas que povoavam minha fantasia e de repente numa esquina, um susto; um casal de mascarados.. lindas máscaras... o carnaval de Veneza estava dando os primeiros sinais. Feliz coincidência. Lembrei-me do filme, a máscara marcava o anonimato do veneziano. A persona? No latim, persona designa a palávra máscara, define as características e personalidade  do ser representado.

E nós, no cotidianos usamos máscaras? Somos personas em alguns momentos? Nos transformamos  ou representamos outra pessoa?Adquirimos outra personalidade, aptos a enfrentar qualquer realidade?
Não raro, usamos máscaras invisíveis, quase imperceptíveis, no sentido de enfrentar as mais diversas situações. Elas nos trazem uma conotação mágica: estaremos algumas vezes representando? Talvez sim, para evitar o sofrimento nosso e do outro, como uma defesa.

No teatro, as máscaras sempre foram aproveitadas. Os gregos foram os primeiros a usar máscaras no teatro. Identificavam o personagem em cena, definindo seu caráter e sentimentos, tanto é que a palavra hipócrita, vem do grego: hypókrités, que significa ator, ou seja, a pessoa que tem  várias faces por causa do uso constante de máscaras.

Sonhava ..com as máscaras
Mas, voltando ao roteiro, depois desta divagação: na realidade, se percorre Veneza sem traçado, sem destino. Apenas, caminhar para ver o que encontraremos. A cidade é cortada por canais e ruelas. A ponte do Rialto, a Ponte dos Suspiros. Puro encanto! Entrada nas igrejas, passar por restaurantes, lojas, cruzar por centenas de turistas falando diversos idiomas e de repente a chegada ao Grande Canal que representa a principal avenida de Veneza. Impactante visão! Este canal corta Veneza ao meio e ao longo tem os ancoradouros para gôndolas, de onde parti e ouvi o gondoleiro cantar "O sole Mio". Foi quando  chorei as lágimas mais doces de minha vida.

Não fui à Ilha de Murano mas assisti em Veneza a técnica secular de fabricação de "Vidro Soprado". Os artesãos "dão vida" à cristais coloridos de todas as cores e tamanhos.. trazer uma peça como souvenir é preciso, indispensável, pois como dizia Simone de Beauvoir, "um lugar permanecia virgem de qualquer olhar enquanto eu não o via com meus próprios olhos". E pensava que para lá provavelmente eu não retornaria mais. O mundo é grande e fascinante demais para retornos.

Um passeio em frente ao Palácio do Dodges a antiga sede do governo; fica em frente à praça de São Marcos , repleta de pombos. Um problema que a ecologia está tentando resolver. Embelezam a cidade mas sujam os monumentos.

É uma lástima que  recentes pesquisas tem encontrado o fato de existir o impacto da poluição ambiental. Em função de seus efeitos sobre o nível das águas das marés, a linda Veneza está afundando. Muito lentamente mas certamente milímetros por ano. Quando as águas das marés sobem, inundam parte da cidade. Isto preocupa as instituições governamentais, pelo fato de que, num futuro distante mas possível, Veneza possa sumir entre as águas. Já estão providenciando a construção de barreiras móveis impedindo este lento afundamento.


  Seria uma perda inestimável para a humanidade; a cidade considerada a mais romântica do mundo, só restaria nas fotos, nos documentos, em registros como aconteceu com outros grandes patrimônios históricos da antiguidade. Porém, confio nos recursos da  tecnologia: salvar a preciosidade que é Veneza!

 As pequenas pontes de Veneza e as máscaras

E então, para não dizer que esqueci das máscaras:

" Foi bom te ver outra vez..
tá fazendo um ano..
foi num carnaval que passou...
eu sou aquele Pierrot...
que te abraçou..
que te beijou outra vez..
com a mesma máscara negra
que esconde meu rosto..
eu quero matar a saudade..
vou beijar-te agora..
não me leve a mal..
hoje é carnaval.."















1 comentários:

renata lehmann disse...

Sonia, me deste muito prazer ao ler teu texto. Passaste a tua emoção e me contagiaste! Estive lá e foi um encantamento como o teu.
Gostei tb da tua referência às máscaras. Inevitáveis. Estamos constantemente usando máscaras pois senão estaríamos cometendo o sincericídio, rsrs.
Ao ler teu texto tb lembrei do filme Pão e tulipas, que passa em Veneza e conta uma história, que para uma psicóloga como tu, acho que vai gostar. Tem em DVD. Eu, por sorte, ví no cinema. Toda a Veneza com uma fotografia maravilhosa!
esperando teu novo texto, beijos